Fotografia: Gonçalo Afonso Dias
Évora, 2007
(…) Pensamos que se pode dizer, sem qualquer temor de cair no paradoxo, que a fotografia foi inventada para fazer o retrato do homem. É verdade que as primeiras fotografias são de paisagens ou de objectos, e não de homens. É verdade que as primeiras tomadas fotográficas eram de tal forma lentas que se tornava impossível fotografar uma pessoa, que nem sequer devia respirar. Mas tão logo as poses se tornaram toleráveis, talvez com o auxílio de um encosto para a cabeça, que o sucesso do retrato fotográfico se tornou arrasador, de muito longe superior à sua utilidade que, no entanto, é enorme.
Um sucesso que não teve quebras e permanece ainda hoje, pela simplíssima razão de que o retrato corresponde exactamente a necessidades precisas do homem. A menos que não se exasperem certas especializações – a fotografia de objectos para catálogos, por exemplo – o fotógrafo encontrará sempre algo a criar com a imagem da figura humana, na moda, na publicidade, na reportagem e em todos os outros géneros de fotografia.
Contudo, realizar um retrato fotográfico, se se pretender, naturalmente, um resultado apreciável, não é tão fácil como pode parecer. E ainda é menos fácil, se não completamente impossível, ensinar a fazer um retrato.
Não tanto pelos aspectos técnicos, uma vez que para os ensinar existem hoje na literatura fotográfica óptimos manuais; nem sequer pelos aspectos de composição e formais, que até nem são assim tão complexos, mas antes pelo conteúdo, a própria substância do retrato, pelo significado que se lhe pode e deve conferir. Para que um retrato seja qualitativamente apreciado, é evidente que deve ser tecnicamente perfeito que, de um ponto de vista formal, deve responder a determinados requisitos, mas é igualmente claro que, deve dizer-nos alguma coisa, mais sobre o seu autor para além da descrição da sua habilidade na utilização das objectivas e das luzes, ou da educação do seu gosto e da sua maneira de ver.
Um retrato deve dizer-nos qual é o pensamento, a opinião do autor sobre a pessoa que foi retratada; se o fotógrafo conseguiu, ou não, estabelecer uma relação com o seu tema: quem é a pessoa fotografada, que tipo humano representa, a que classe ou a que estrato pertence, qual o seu temperamento, o seu ânimo; se é rica ou pobre, feliz ou infeliz, alegre ou triste. Estas e outras coisas podem ser encontradas num retrato fotográfico. Nem sempre, e não necessariamente, todas juntas, mas são estes os elementos que constituem a substância do retrato.(…)
(A Fotografia – as formas, os objectos, o homem - Antonio Arcadi – Edições 70)
No comments:
Post a Comment