Saturday, June 23, 2012

Todos diferentes, todos iguais.





(Fotografia: Gonçalo Afonso Dias, Ilha do Mussulo, Angola, 12/2011)


(Texto no Olhares.com) :

Esta fotografia é dedicada ao João Clemente que, na foto "Sem medos" (http://olhares.sapo.pt/sem-medos-foto5295723.html?nav1 ) desta série expressou uma dúvida muito pertinente sobre estas crianças: "criançada muito alegre, não sei se feliz..".

Sem entrar em reflexões filosóficas do que é a felicidade (uma utopia..., uma abstracção...) essa questão permite-me, neste resumo, dar-vos a conhecer um pouco mais do contexto social e humano em que estas crianças vivem, comparativamente com a maioria das crianças angolanas, uma reflexão baseada no meu profundo conhecimento da realidade Angola, e particularmente das suas crianças um pouco por todo o país, antes e depois da independência, antes, durante e depois da guerra civil que só teve fim em 2001.


O que distingue estas crianças, por ex dos meninos de Luanda?
Qual a razão da sua alegria?

São duas questões cuja resposta, precedida de uma breve contextualização, explica esta realidade.
Os meninos do Mussulo, que acompanho, fotografo e ajudo há mais de oito anos, vivem numa ilha. Apesar da proximidade à grande e densamente povoada Luanda (mais de cinco milhões de habitantes...) na sua grande maioria, não a conhecem. O seu mundo resume-se à ilha onde nasceram e onde continuam a crescer.

Longe do caos, das tentações, dos perigos com que vivem os meninos de Luanda e um pouco por todo o país, não lhes falta o essencial. Os pais, em grande parte ilhéus também, vivem do que o mar lhes dá - o peixe, o marisco.

As famílias no Mussulo mantêm uma estrutura ancestral. Aos mais velhos são respeitados e ouvidos, os mais novos são protegidos e bem alimentados.

A solidariedade existe na comunidade. A entreajuda, as relações entre famílias.

A grande ameaça para esta gente boa é a doença - a Malária, a cólera. Mas, hoje, com as campanhas de consciencialização e de prevenção que têm vindo a ser feitas por todo o país, esses flagelos perderam muito terreno.
O meninos do Mussulo vão à escola, vão ao posto médico e não sabem o que é pedir, o que é passar fome, o que é ver os pais mortos ou mutilados - já nasceram, na sua maioria, em Paz.
Não têm IPods, computadores, brinquedos sofisticados... Mas têm uma imensidão de praia, têm o mar... Constroem, a partir do lixo criativos e engenhosos brinquedos.

Como todas as crianças, como todas as pessoas, têm momentos de tristeza e momentos de alegria. Mas têm momentos de alegria! Muitos, mesmo.
É uma alegria que nasce com eles, que caracteriza, por outro lado, todo o povo angolano que, mesmo vivendo dificuldades para nós inimagináveis, consegue sorrir, cantar e dançar.
Tenho a honra, o gosto e o orgulho de ter proporcionado ao longo destes anos, alguns dos momentos de alegria destes meninos. Tenho-os visto crescer, têm-me visto crescer.

Dia 30 deste mês volto a Angola no âmbito das minhas actividades profissionais e comigo levarei a certeza de os encontrar bem. Levarei uma bola de futebol... Uma corda de saltar e os retratos que lhes fiz e que estão nesta série tão bem acolhida por todos vós - o que agradeço profundamente - por eles. Bem hajam!

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