


(...) O conceito de identidade cigana é, por assim dizer, uma self-fulfilling prophecy: existe um consenso alargado, tanto do ponto de vista émico como ético, sobre o que é «ser cigano», e portanto não se discute; opta-se, em alternativa, por folclorizá-lo (exotizando-o) ou por denunciar tentativas e estratégias hegemónicas de combate a essa identidade e tradição «diferente». Do ponto de vista histórico, os estudos sobre ciganos denunciam um processo marcante: o da transformação da «ciganidade» de uma «raça» — nas últimas décadas do século xx — numa «minoria étnica». Esta transformação é concomitante com a mudança de paradigma, nos projectos científicos, que foi rejeitando retratos culturalistas homogéneos e primitivistas em favor de uma complexificação do social através da consciência do pluralismo que, em última instância, o define. Ambos os processos redundaram numa opção «política», na literatura recente sobre os ciganos em Portugal, de denúncia de lógicas de exclusão e marginalização dos mesmos, frequentemente sem o necessário esforço de questionamento epistemológico dos conceitos empregues nessa denúncia.(...)
in: Maria Manuela Ferreira Mendes, Nós, os Ciganos e os Outros, Etnicidade e Exclusão Social
(Lisboa, Livros Horizonte)
No comments:
Post a Comment