A ARQUITECTURA PORTUGUESA - "BARALHAR PARA VOLTAR A DAR"
Tenho em relação à arquitectura que vai sendo feita por arquitectos portugueses uma inquietação idêntica à que tenho no que diz respeito à "nossa fotografia", "à nossa pintura", à nossa escultura", enfim às nossas diversas formas de expressão artísticas.
Vivemos tempos onde a "palavra-chave" para o sucesso parece ser o "IMPACTO".
Na fotografia, esse "impacto" traduz-se, frequentemente, em imagens fotográficas (Não Fotografias...) de discutível qualidade mas com essa espécie de "magia" de fazer com que o observador menos informado, menos culto, se sinta (Impa)cotado...
Quem conhece e estuda os grandes mestres da fotografia internacional - Henri Cartier- Bresson, por ex - e portuguesa também: (Victor Pala, Gérard Catello-lopes, Carlos Afonso Dias, Carlos Calvet, António Sena, entre muitos outros) percebe que esse preceito - o "Impacto"- não fazia parte das suas preocupações nem tinha lugar na sua gramática de expressão artística - muito pelo contrário. A subtileza, a simplicidade, a singeleza das imagens que captaram revelam, acima de tudo uma forma inteligente de ver o Mundo - onde as mensagens estão implícitas, onde a revolta e o inconformismo se descobre com prazer em cada uma das suas fotografias.
Sem "IMPACTO", sem "ARTIFÍCIOS", sem "TRUQUES.
Hoje, na arquitectura, nomeadamente naquela que é feita por portugueses, confronto-me com o mesmo embaraço... O impacto parece prevalecer sobre o conteúdo, sobre o processo criativo, sobre o percurso (tão relevante na conquista das formas e dos espaços).
A verdade da arquitectura é subvertida pela imagem - aquela fotografia tipo "visão de toupeira" ou "olho - de - boi" que depois de passar pelo Photoshop faz as delicias dos arquitectos e das revistas da especialidade.
Por outro lado, a consciência e a intervenção política fundamental na arquitectura como em qualquer forma de expressão (artística ou não) tornou-se numa abstracção - algo até a evitar...- entre os nossos "cérebros".
Vivemos tempos socioeconómicos extremamente difíceis e penalizadores para aqueles que menos podem. Já foi dito e redito, bem sei...
Tempos que, na minha opinião, requeriam das "prima-donas" da arquitectura "portuguesa" uma posição firme, um repensar de preconceitos e de pressupostos, uma atitude activa e influente.
Nada. Siza Vieira, "nasceu" após o 25 de Abril, com uma actuação declaradamente política e com preocupações manifestamente humanas e sociais. Foi assim que se "fez" notar por cá e lá fora.
Contudo, neste tempo de "asfixia" não lhe ouvi uma palavra...
Já de Souto Moura, um sucedâneo de Siza, não esperava muito mais.
E como seria relevante uma declaração objectiva e substantiva de qualquer uma destas "estrelas"...
Enquanto a pratica da arquitectura agoniza entre nós, a Ordem dos Arquitectos Portugueses (O-A) pura e simplesmente não existe.
O nº de arquitectos desempregados há muito ultrapassou os 40%.
Com a (O-A) e com o seu bastonário - João Belo Rodeia - já nem quero perder muito tempo... Cansei-me de "malhar em ferro frio".
Falo (escrevo) apenas do que vejo. E o que vejo é o esvaziamento qualitativo da arquitectura, a colagem despudorada a modelos "importados" - a Holanda, por ex., a total ausência de uma actividade crítica, permanente, consistente, objectiva.
Reproduz-se em Portugal, com evidente sucesso, aquilo que de menos verdadeiro se faz por essa Europa.
É por isso que, na minha opinião, é urgente "baralhar para voltar a dar".
Voltar a conferir um significado e uma dignidade à nossa actividade, valorizar as heranças de saber (Távora, por ex.), estudar, utilizar "a dúvida" como método humilde e consistente para ir mais longe.
De outro modo, os projectos e as obras que por aqui se vão fazendo nunca passarão de ridículas imitações - limitadas intelectualmente, amputadas no desejo.
Gonçalo Afonso Dias - 05-2012
1 comment:
assino por baixo
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