Os arquitectos, de um modo geral, gostam de mostrar as suas obras, os seus sucessos, as suas "habilidades".
Está bem, é natural.
No entanto, quando já se tem uma certa "rodagem", uns largos anos de actividade, uma boa dose de "desilusões", impõe-se, acho eu, uma reflexão séria sobre os motivos de alguns "fracassos".
Penso que é tão importante reflectir sobre os "projectos falhados" como enaltecer aqueles que são conseguidos - e seguidos, publicados, nomeados.
Eu não tenho esse problema - já aqui dei conta, por ex, e um projecto que falhou literalmente - A casa em Santiago - por não ter conseguido a empatia e o envolvimento imprescindível com o "Dono da Obra".
Como quase todos os arquitectos (se não todos) tenho um considerável número de propostas (projectos preliminares) a enrugar no "arquivo morto".
Uns, porque não consegui a empatia tão decisiva, com os desejos e com os sonhos dos "clientes". Outros, porque, pura e simplesmente, "morreram na praia".
Hoje, entendo que não existe esse "arquivo morto". Ficam sempre resíduos, apontamentos, ideias, que mais tarde, imprevisivelmente, renascem e informam outras propostas.
Cria-se uma espécie de "reserva", silenciosa mas omnipresente.
Um desenho, feito com paixão, uma ideia que surge do "aparente nada", constituem um património de relevante valor em "invenções" futuras.
Esta é uma introdução para uma "história" que vivi intensamente e que, hoje, considero exemplar.
Vivia em Londres, era coleccionador de arte contemporânea, de automóveis antigos e notáveis, excêntrico, divertido.
Tinha, alegadamente, comprado um terreno de sonho (também)... Nas falésias sobre o mar, em Assafora, perto de Sintra.
Tinha um ideal... Uma casa que albergasse a sua colecção de arte, os seus vários automóveis, as suas fantasias...
Convenceu-me a projectar uma casa que se pudesse movimentar (em direcção ao mar), sobre carris. Tinha ideias fantásticas - por ex. um enorme LCD na sala, que reproduziria em "directo" o estado de espírito do Mar, num desejo de o ter dentro de casa...
No projecto estava também envolvido um companheiro de outras aventuras - o artista plástico João Louro.
Depois dos primeiros estudos, esquissos, e ideias mais ou menos viáveis, o meu amigo deixou de dar notícias...
Vim a saber, mais tarde, que tinha abdicado dos seus sonhos e comprado uma casa, lá para os lados de Azeitão, projectada pelo ilustre e incontornável Tomaz Taveira...
Chegou ainda, insatisfeito que estava, a solicitar-me uma remodelação da dita... Recusei, é claro.
A prática da arquitectura é feita, também, destas histórias.
Ensinam-nos muito, se tivermos a humildade de com elas aprender.
Fica sempre alguma coisa. Nem que sejam as fotografias ... e os desenhos.
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